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SOBRE O PAISAGISMO BRASILEIRO

Os trabalhos de paisagismo têm longa tradição no país, tendo suas origens no final do século XVII com o projeto para o Passeio Público do Rio de Janeiro, concebido por Mestre Valentim, durante a gestão do vice-rei Dom Luís de Vasconcelos em 1773.
Durante o século XIX, com a construção da nação brasileira, com o aumento das populações urbanas e a mudança dos hábitos sociais, o projeto de paisagismo urbano se consolida no país, tendo como principal cliente e mecenas, a elite do Império e da República Velha, que patrocinou o ajardinamento e tratamento paisagístico das suas áreas de moradia, propiciando a criação de praças, parques públicos e privados, boulevards, promenades e jardins sofisticados, pelas quais passeavam as famílias de posses de então.
O principal paisagista do Império foi o francês Auguste François Marie Glaziou, que foi chamado por Dom Pedro II para trabalhar no país em 1858 e aqui projetou os parques da Corte, entre eles o da Quinta da Boa Vista, o de São Cristóvão, o do Palácio de Verão de Petrópolis, o do Barão de Nova Friburgo em Nova Friburgo, o Parque São Clemente e muitos outros, e ainda a requalificação do Passeio Público .
Sua obra, de alta qualidade, incorporou a tradição anglo-saxônica do tratamento da paisagem a tropicalidade da vegetação local, criando uma simbiose perfeita entre a rica flora existente e os cânones românticos de sue modo de projetar.
Muitos foram os paisagistas que trabalharam com o paisagismo no século XIX e no século XX. Durante a Primeira República, especialmente no Rio de Janeiro e São Paulo, como Paul Villon, Arsene Puttmans e Reynaldo Dierberguer, produzindo tanto para particulares como para o Estado.
A tradição cultural do período, fortemente influenciada pelas tradições européias - francesas, italianas e inglesas - se reflete diretamente na configuração do projeto paisagístico nacional, que é resultado de uma mescla de simbiose constante de ideais, formas, materiais e vegetação tropical ou não.
A este modo de pensar e conceber o projeto, denominamos de Eclético, que tem dentro de si três correntes formais principais: Clássica, Romântica e Mista Clássico-Romântica.
O século XX marca a consolidação da atividade paisagística no país, com o aumento das demandas de espaços tratados paisagisticamente pela população urbana, em constante expansão. Neste século as transformações sociais e urbanas são constantes e o Brasil chega ao século XXI como uma nação totalmente urbana, possibilitando, principalmente após os anos 1950, a ampliação do mercado de trabalho, tanto dentro do âmbito público como privado.;
Ao mesmo tempo que aumentas as opções e a diversidade do lazer para a sociedade em geral, maiores são os segmentos sociais a demandar espaços para atividades ao ar livre e a recreação é um dos motes para a organização do espaço livre, tanto público como privado. Os equipamentos específicos para o lazer se tornam comuns, primeiro os playgrounds e quadras esportivas, depois as piscinas (principalmente nos prédios de classe média e residenciais de classe média-alta) e o banho de mar e o encontro na praia, se tornam hábitos em todas as cidades praianas brasileiras. O tratamento do espaço do pedestre, das calçadas, começa a ser discutido com a implantação de vastas áreas pedestrianas, como um modo mais eficiente de circulação.
Praças e parques já não são mais redutos das elites, que esporadicamente e em locais pré-determinados a eles se dirigem, sendo solicitada sua instalação e gestão nos bairros e subúrbios populares distantes, carentes de qualquer estrutura espacial mínima de lazer.
O século XX é um período de rupturas formais no paisagismo, a primeira delas originando o que denominamos de Escola Modernista, com forte influência do trabalho geometrizado e funcionalista dos paisagistas californianos, como Church, Eckbo e Halprin e dos fortes e pessoais traçados plasticamente rocambólicos ou por vezes também geométrico de Roberto Burle Marx.
Este foi o primeiro paisagista a romper os cânones tradicionais do Ecletismo, em obras de porte para o governo do Estado Novo. Sua obra, baseada em um sentimento nacionalista forte e formalmente diferenciada, se tornou ícone da modernidade de então, sendo o paisagista constantemente chamado para colaborar nos grandes projetos do período getulista e dos primórdios da Nova República, até sua morte em 1994.
A alta qualidade do seu trabalho, o porte, visibilidade e volume da totalidade da sua obra, garantiram a Burle Marx um papel fundamental na história do paisagismo nacional e internacional.
Paralelamente ao trabalho de Burle Marx, isolados nos diversos estados, um sem número de projetos de autores de qualidade são produzidos, como os de Miranda Magnoli, Rosa Kliass, Benedito Abbud e Maria de Lourdes Nogueira, ao mesmo tempo que dentro da universidade pública são estabelecidos e firmados os conceitos e métodos do paisagismo por Miranda Magnoli e equipe (na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo) de 1975 em diante.
A segunda ruptura, de caráter estritamente formal, a qual origina o que designamos linha projetual Contemporânea, começa embrionariamente nos anos 1980, com a introdução dos conceitos ecológicos no país e com a achegada de informações das novas obras feitas no exterior, em especial Estados Unidos, França, Espanha e Japão, e se estrutura em duas correntes básicas. A primeira nitidamente ecologista, na qual se valorizam os cenários rústicos, a conservação e o contato com a natureza e cênica, produzindo verdadeiras colagens, que vão de um radical, chegando a situações de irreverência formal absoluta.
Este modo de projetar redireciona a obra de muitos dos pioneiros do paisagismo modernista, que utilizam em suas obras da virada do século os novos ícones projetuais e de particulares e agências de governo, que criam um sem número de projetos com tal teor.
São exemplos desta forma de projeto a maioria das intervenções do projeto Rio-Cidade (anos 1990 na cidade do Rio de Janeiro), a nova orla de Salvador, alguns parques de Curitiba, centenas de jardins particulares e a Praça Itália em Porto Alegre, de autoria de Carlos Fayet e equipe (1992), o marco desta nova geração projetual.

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